Bate-papo com Atena Beauvoir Roveda aborda diversidade no setor público

Bate-papo com Atena Beauvoir Roveda aborda diversidade no setor público

No mês do Orgulho LGBTQIA+, o Sintergs promoverá uma roda de conversa com o tema Diversidade na Administração Pública. A convidada especial é a educadora e escritora Atena Beauvoir Roveda, ativista das causas do movimento trans. O evento será no dia 23 de junho (quinta-feira), a partir das 18h30, na sede do sindicato. O encontro, que terá transmissão ao vivo pelo Facebook, é uma iniciativa do Diversidade Sintergs*, grupo criado pelo sindicato para trabalhar com políticas afirmativas. Confira a entrevista com a ativista, que é licenciada em Filosofia pela UFPEL e mestranda em Antropologia pela UFRGS.

1- Você já atuou como docente no Estado. Quais as principais dificuldades encontradas pelos trabalhadores do setor público no que diz respeito aos mais diversos tipos de preconceito?
Acredito fortemente que uma formação docente continuada, que se preste a entender não somente os conteúdos do pensamento lógico e das questões vinculadas às matérias e às disciplinas que cada qual tenha que lecionar. Mas também (acredito) em um desenvolvimento emocional e humano que integre a razão e a lógica, e que também entenda a sensibilidade, o respeito, a dinâmica das emoções. Acredito que falte esta educação continuada baseada nas questões do caráter da humanidade de maneira a entender o que (cada um) carrega no coração. Falta uma formação do coração, não só da mente. E eu acredito que os professores e professoras, todas nós precisamos compreender que se o cérebro da gente é o grande incentivador de descobrir o mundo, o coração do professor e da professora é o grande continuador dessa expressão de justiça e de respeito que deve existir nos nossos alunos e nas nossas alunas.

2- Que ações e políticas públicas a Administração Pública pode promover para combater a LGBTfobia?
A principal demanda que se solicite para a Administração Pública em relação à questão de ações e políticas públicas para promover o combate à LGBTfobia, principalmente, são dados. Nós não temos dados e dados não são frutas que caem das árvores (rsrs). Até porque achamos que fruta é um elemento simples para cair da árvore, mas na verdade não, é todo um processo da natureza para produzir um fruto. Então, eu entendo que falta a intencionalidade de termos dados que geram informações – e dados não são informações, dados são conjuntos de elementos que nos indicam resultados de cálculos que se fazem dentro da estatística e da geografia, por exemplo, em relação ao que está acontecendo com a população LGBT. Mas a gente precisa tornar esses dados legíveis e entendíveis sobre o que está, de fato, acontecendo na nossa sociedade com diversos cenários, apontando onde nós precisamos aplicar políticas públicas que impactem LGBTs. A gente tem que diferenciar que políticas públicas para LBTGs é uma coisa, políticas públicas que impactem LGBTs é outra. O grande galardão desse processo, o que nos preenche de vitalidade para dar continuidade a estes mecanismos, é a formação emocional. Então, nos falta: dados observados enquanto resultados – informação de fato sobre a população LGBT – e avaliar quais são as regiões mais necessitadas, onde há maior índice de violência. É inegável pensar também onde há falta de assistência nas questões de saúde pública e de educação pública, (pois) é onde vão acontecer violências LGBTfóbicas. Está tudo inserido, é onde vai existir mais fortemente as questões do racismo, institucionalmente e socialmente falando.

3- E no que diz respeito à representatividade nos espaços de decisão, qual avaliação você faz sobre a presença do público LGBTQIA+ na política?
A gente já percebe que a democracia representativa, que é a teoria que embasa as eleições, os votos, as câmaras legislativas e o Executivo, tem as suas fragilidades. E uma delas é termos pessoas LGBTs sem termos, de fato, um retorno para a população LGBT. Historicamente, a gente tem a luta social pela diversidade sexual de gênero vinculada às questões da esquerda. Entretanto, hoje a gente já vê esse paradigma endossar uma outra água e o campo da direita, o campo conservador, ter pessoas LGBTs. Eu escutava um dia desses, e lembro muito da Margaret Thatcher, sobre o quanto se defendia a necessidade de mulheres como lideranças políticas. E hoje a gente faz uma leitura de que ela era uma mulher, estadista. Entretanto, fez ruir pra cima do trabalhador e da trabalhadora pobre do Reino Unido tantas situações de aflição e sofrimento social. Então, não basta ser LGBT para representar a questão de decisão. E eu avalio fortemente que antes de nós pensarmos numa liderança tão somente LGBT, a gente tem que pensar numa liderança que tenha experiência, não só de Administração Pública, porque é difícil nós termos o acesso de fato, mas uma experiência de uma movimentação, de uma liderança pública, sem ter sido eleita de fato. Então, a gente tem um trabalho muito forte, muito grande, para esse campo LGBT. Acho que falta-nos, de novo, uma capacidade de inteligência administrativa pública para que se faça um processo político deveras qualificado. Porto Alegre é uma Capital historicamente vinculada a uma democracia pública e social. Com os tempos, foi virando o barco para uma especiaria conservadora especialmente dinâmica e, ao mesmo tempo, a gente tem perda total de determinados tipos de direitos – saneamento básico, cobradores de ônibus que não estão mais trabalhando, perda de linhas de ônibus… se eu pensar nestas demandas sociais todas, vou estar incorporando a população LGBT neste processo. A população LGBT também pega ônibus, a população LGBT também vai no posto de saúde. A gente precisa dar apoio ao trabalhador e à trabalhadora dos espaços públicos, os servidores públicos, todos aqueles que trabalham no serviço público são servidores públicos, de algum jeito, eles servem ao público que usufrui do bem público. A gente tem que dar conta de compreender o esforço que os servidores públicos fazem para manter a mínima qualidade. Mas, óbvio, a nossa humanidade é uma humanidade que às vezes fica cansada. Então, a gente tem que entender que fortalecendo os servidores públicos, às vezes a gente fortalece uma política de assistência, de atendimento e de permanência da população LGBT nestes espaços de saúde, de educação e de segurança pública.

* Criado pelo sindicato em março deste ano, o grupo Diversidade Sintergs é formado por servidores dispostos a pensar em políticas afirmativas para promover ações e participar de atividades que contribuam na redução do machismo, do racismo e da LGBTfobia no serviço público e ambiente sindical. A comissão também visa fortalecer a representatividade e combater práticas discriminatórias.

Compartilhe:

Verified by ExactMetrics