Com a defasagem salarial, qualidade de vida dos servidores diminui
Especial – Dia do Servidor
A falta de reposição da inflação impactou na vida dos trabalhadores do serviço público estadual nos últimos sete anos. São profissionais que se dedicaram a estudar para serem aprovados em um concurso e que hoje não têm seus direitos respeitados. O artigo 37 da Constituição Federal de 1988 garante aos servidores públicos a correção anual de sua remuneração, inclusive durante o estado de calamidade pública decretado em função da pandemia. No entanto, os últimos dois governos não cumpriram o que prevê a Constituição.
O salário de funcionário público de nível superior há dez ou quinze anos atrás era atrativo, mas se tornou defasado e insuficiente para cobrir as despesas básicas de uma família. Foi o que aconteceu com Luciano Homrich Neves da Fontoura, engenheiro mecânico da Secretaria de Obras e Habitação do Estado. Para priorizar o investimento nos estudos da filha, o servidor abriu mão de residir em um bairro central e enxugou as despesas fixas para reorganizar o orçamento.
Luciano morava de aluguel e planejava comprar a casa própria no Menino Deus. Além de ter crescido no bairro, gostaria de permanecer na região também por ser próxima do seu trabalho, que ficava a menos de dois quilômetros dali. Em 25 minutos de caminhada, se deslocava tranquilamente até o Centro Administrativo Fernando Ferrari (CAFF). O hábito também proporcionava bem-estar e satisfação: andar a pé era uma forma de contribuir com menos poluição ao meio ambiente.
Era abril de 2017 quando juntou o valor necessário para dar a entrada na tão sonhada casa. No bairro Menino Deus, um imóvel custaria em torno de R$ 500 mil, enquanto no bairro Nonoai, distante sete quilômetros do trabalho, uma casa semelhante custava a metade do valor. Luciano colocou tudo na ponta do lápis e, principalmente em função do salário estagnado, decidiu mudar de bairro.
O antes e o depois
“Antes, no fim de semana, eu atravessava a rua e estava no parque (Marinha do Brasil). Agora, a minha qualidade de vida caiu um pouco, porque eu não consigo ir a pé para o trabalho, dependo de usar o carro. Tive que reduzir tudo que eu pude”, afirma o servidor. Cancelou a assinatura da televisão a cabo, reduziu o pacote de internet e o plano do celular. Desde então, também não trocou mais de carro. “Essa é a minha realidade”, afirma.
Foi desta forma que conseguiu manter a filha, de 18 anos, em uma escola particular. Mas agora, com a filha prestes a concluir o Ensino Médio, Luciano começa a se preocupar com o ingresso na universidade. “Nós, como classe média, não conseguimos mais pagar uma universidade privada para os filhos. Só por meio de crédito educativo”, lamenta o servidor, que sempre valorizou a educação. Tanto que fez dois cursos de aperfeiçoamento – MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getulio Vargas e especialização em Gestão Pública pela Uergs.
A remuneração bruta de Luciano é a mesma de 2014. “As minhas aspirações financeiras não são grandiosas. Quero viver com equilíbrio e sem agredir o meio ambiente. Eu não estou pedindo nada mais que o justo, que é a reposição da inflação”, reivindica o servidor, que costuma fiscalizar obras de até R$ 10 milhões.
Sobre a atual política de Estado mínimo, Luciano acredita que os últimos governos estão errando na gestão. “O Estado tem que pensar em aumentar o número de servidores, e não em reduzir. Serviço público em um país como o nosso é distribuição de renda”, defende. O servidor acrescenta que a PEC 32, que tramita na Câmara dos Deputados, irá prejudicar, sobretudo, os trabalhadores que ganham menos. “É um país muito injusto, muito desigual.”
Empréstimos viraram rotina
Servidora da Secretaria da Agricultura que prefere não se identificar acrescenta que, além do salário ser o mesmo há sete anos, os descontos aumentaram. Em razão de um câncer, viu o orçamento familiar encolher ainda mais nos últimos anos. “Estou sempre devendo para o banco”, relata a médica veterinária. Em licença saúde, toma diariamente sete medicações.
A proximidade da chegada do 13º salário traz um alento para colocar as contas em dia. “Estou esperando o 13º salário para ver se eu boto o nariz pra fora da lama. A nossa sorte é que temos crédito”, avalia. O empréstimo consignado passou a fazer parte do orçamento da servidora.
Reportagem: Bruna Karpinski
Edição: Karen Viscardi
Foto: Luiz Felipe Correa
Compartilhe: