Farmacêutica denuncia ‘machismo estrutural’ no serviço público: “é preciso ter muita firmeza”
Na semana do Dia Internacional da Mulher, celebrado neste 8 de março, o Sintergs publica uma série de entrevistas com trabalhadoras que representam as mulheres no serviço público, suas histórias, desafios e perspectivas. Nesta quarta-feira é a vez da farmacêutica Jéssica Melo da Silva, coordenadora do Núcleo de Segurança do Paciente da Vigilância Sanitária e chefe substituta do Núcleo de Vigilância de Estabelecimentos de Saúde.
JÉSSICA MELO DA SILVA
Eu pensei em fazer faculdade de Administração. Tempos depois, mudei para Química. Mas a vontade de ter uma participação mais direta no cuidado humano me fez decidir ser farmacêutica.
Hoje, trabalhando na Secretaria da Saúde há sete anos, ainda que não tenha contato direto com pacientes, sei que todo meu trabalho voltado para a melhoria da qualidade dos serviços de saúde reflete diretamente na melhoria da qualidade do cuidado prestado.
Mesmo que eu não esteja lá na ponta, aqui no Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS), trabalhando com os estabelecimentos de saúde de todo o Estado, consegui o que queria: cuidar das pessoas.
Coordeno, desde 2016, o Setor de Controle de Infecções, que é responsável pelo monitoramento das infecções que podem acometer os pacientes em hospitais e clínicas e da identificação de micro-organismos multirresistentes. Além disso, também Coordeno o Núcleo de Segurança do Paciente da Vigilância Sanitária Estadual, responsável pela avaliação dos processos estabelecidos pelos serviços de saúde para prevenção de eventos adversos e investigação, quando ocorrem.
Trabalhamos construindo referências normativas para o funcionamento dos mais diversos tipos de estabelecimentos, de clínicas de estética até Unidades de Terapia Intensiva. Também somos responsáveis pela capacitação permanente dos fiscais sanitários que atuam nas 19 Coordenadorias Regionais de Vigilância em Saúde.
Além disso, trabalhamos continuamente em cooperação com as demais áreas técnicas da Secretaria, contribuindo não apenas com o olhar da vigilância sanitária, mas também aplicando todo o conhecimento da formação profissional para garantir que cada situação-problema seja submetida a um olhar multidimensional.
Frequentemente unimos esforços com as demais vigilâncias, por exemplo, a epidemiológica, para a investigação de um surto ou para estabelecer medidas de contenção mediante um evento epidemiológico, como tem se apresentado para nós o surgimento do coronavírus; temos empreendido esforços em estabelecer orientações nas mais diferentes esferas, não apenas em serviços de saúde, mas orientando os mais diversos públicos, inclusive os nossos trabalhadores.
A função de fiscalização, por si só, se desenha como uma situação de enfrentamento. É necessário grande equilíbrio para que conflitos sejam evitados ao fazer um apontamento a um outro profissional, que está em um estabelecimento.
Entretanto, muitas vezes nos deparamos com o machismo que permeia todos os setores da nossa sociedade, e nessas situações é muito complicado dar continuidade ao nosso trabalho sem que haja enfrentamentos mais contundentes.
Muitas vezes observo que em um ambiente os homens tendem a se reportar a outros homens, ignorando as mulheres presentes, mesmo que tenhamos nível de autoridade igual ou superior.
A interrupção, por vezes abrupta, durante importantes falas das mulheres também ocorre com frequência; este é um dos momentos em que é necessário muita firmeza e controle para deixar explicito que você não terminou a sua fala e retomar a palavra (sem perder a calma pois, afinal, quando isso acontece, somos taxadas de desequilibradas).
Diante de uma ação potencialmente problemática, ouvimos muito a recomendação para “levar um colega homem junto”. Particularmente, esse é o tipo de sugestão que eu costumo rejeitar, pois acatá-la seria me dobrar às inúmeras tentativas do machismo estrutural de diminuir nossa autoridade e invalidar nossas posições.
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