Nos tornamos Naziazeno

Nos tornamos Naziazeno

Joanes Rosa
Diretor 2º Secretário
*

Houve um tempo em que o funcionário público, na sua maioria, mesmo que às duras penas, conseguia viver com certa dignidade, com os vencimentos que recebia. Comprava os alimentos, roupas para si e seus filhos, pagava as prestações do BNH ou comprava um terreno e, aos poucos, ia adquirindo o material para construir uma casa modesta.

Aqui, na Província de São Pedro não era diferente, embora o histórico de privilégio de determinadas carreiras, que persiste até hoje, não foram submetidas às agruras do sacrifício da sobrevivência. Desnecessário, mas justo, rememorar que as carreiras jurídicas e fazendárias, que sempre ocuparam o topo da pirâmide salarial, não passaram por estas situações a que a maioria dos servidores foram submetidas.

Em seu memorável romance, Os Ratos, Dyonélio Machado (Quaraí, 21 de agosto de 1895 – Porto Alegre, 19 de junho de 1985) nos conta o drama de Naziazeno, um funcionário que sendo cobrado de uma dívida para com o leiteiro, sob pena de ter suspensa a entrega diária do leite, se submete a uma série de constrangimentos e peripécias no intuito de conseguir dinheiro para saldar a dívida. Assim estamos nós, vivenciando, na carne, a humilhação e o desespero a que Naziazeno foi exposto, resultado dos períodos de vencimentos atrasados e com uma defasagem salarial que ultrapassa os 50%. O grau de penúria a que foram submetidos os servidores públicos do Estado do Rio Grande do Sul, famoso por suas “façanhas”, causaria pena ao próprio Naziazeno.

Hoje, nossos colegas sobrevivem de empréstimos, um verdadeiro Tártaro, (lugar mitológico, o mundo dos mortos, tão distante da superfície da terra quanto o céu em que se jogasse nele uma bigorna, levaria nove dias e nove noites para chegar ao fundo) junto às instituições de crédito, principalmente junto ao Banrisul, com o seu contracheque estrangulado e a trágica perspectiva de ter algum bem, que ainda resta, penhorado. Os dois últimos governadores: o do “parole” zombava da nossa desgraça, o que não é a característica do “bom moço” que do alto da sua empáfia alega que está impossibilitado de corrigir nossos vencimentos tendo em vista a proibição imposta pela legislação e o escudo do limite prudencial. O certo é que entre o bem mais precioso que é a vida, amparado pela própria Constituição da República Federativa do Brasil, esses carrascos optaram pela guilhotina da superficial e cruel interpretação da legislação.

Parabéns governadores! Vocês superaram o Dyonélio Machado e construíram milhares de personagens tão ou mais miseráveis que o Nazaiazeno!

Foto: Carlos Marcedo

* Artigo publicado no site Sul21 e no Informativo do Sintergs – edição nº 70 – Dezembro/2023

Compartilhe:

Verified by ExactMetrics